ARTIGO

Revolução digital: em um Mundo de Incertezas, Qual o Segredo das Empresas de Sucesso?

09/01/2024 09:00:00

Artigo por Carlos José Pereira, sócio fundador e atual Diretor Presidente da Fácil Informática

Revolução digital: em um Mundo de Incertezas, Qual o Segredo das Empresas de Sucesso?

Muitas empresas estabelecidas, voltadas para a economia analógica, passam por grandes desafios no necessário processo de atualização de suas estruturas para a economia digital. Há uma disrupção em andamento, ainda não estabilizada, e as empresas que não se atualizarem correm o risco de ficarem obsoletas e desaparecem do mercado, frente às empresas concorrentes que tiverem sucesso nessa transposição do velho para o novo.

As empresas estabelecidas são as mais afetadas pela economia digital. Os executivos dessas organizações precisam criar modelos mentais, para modificar suas estratégias e seus modelos de negócio para enfrentamento dessa revolução digital.

As dificuldades das empresas estabelecidas estão ligadas às alterações que devem realizar em suas estruturas, envolvendo as tecnologias brandas e duras, mas faltam teorias específicas, nas quais as empresas possam se basear para absorção de um novo paradigma. Por que isso ocorre?

Diante das inovações disruptivas, as teorias de estudiosos da administração se desatualizam, porque os contextos em que as empresas estão inseridas mudam ou porque suas teorias são generalistas e não se aplicam a casos específicos.

Toda teoria é um modelo explicativo da realidade. Mas diante das disrupções que afetam os sistemas sociais, como se pode afirmar que a realidade continua a mesma? Podem essas teorias passar por provas de conceito e se mostrarem aplicáveis às diversas organizações na realidade atual?

Algumas teorias clássicas, como por exemplo, a Teoria Geral dos Sistemas Sociais, criada por Luhmann, são técnicas teóricas úteis, mas não se aplicam a problemas específicos, de uma organização específica, bem como teorias mais recentes como a teoria proposta por Clayton M. Christensen em suas obras O dilema da inovação e O crescimento pela inovação.

Christensen, afirma que “A teoria é confiável apenas quando sua declaração sobre que ações conduzem ao sucesso também indica como elas variarão à medida que mudam as circunstâncias da empresa”. Ele afirma que existe uma admiração pela aparente intuição de empreendedores bem-sucedidos, mas que essas teorias (intuição) foram aprendidas desde cedo na vida, por meio de um conjunto de experiências e de mentores.[1] Percebe-se que este autor utiliza o termo teoria o que conduz ao entendimento de uma teoria científica, mas fala em intuição e circunstâncias, por isso a preferência neste artigo por modelos mentais, que será objeto de definição apropriada ao longo do texto.

Descarta-se assim, a existência de teorias a serem utilizadas nas empresas, no sentido utilizado regularmente no meio científico, pois os executivos, de acordo com Christensen, devem aprender a intuir e utilizar as pesquisas que ele realizou, a fim de adaptarem suas ações às circunstâncias, para obter os resultados almejados. Assim, entende-se, não há coincidência de ações, ponto por ponto, entre empresas, principalmente porque seus momentos estruturais diferenciados exigem intuição de seus executivos para seguirem os caminhos que entendam serem melhores para suas organizações específicas.

Diante das inovações disruptivas presentes no ambiente, cada organização é afetada de forma diferenciada, dado o seu momento estrutural e cabe aos executivos de cada organização, especificamente, criar seus próprios modelos mentais, que espelham o que fazer diante de determinado problema ou desafio, sem quaisquer pretensões de generalização dessa modelagem para outras organizações. O importante, pensam eles, é atingir o objetivo de levar suas organizações para uma nova realidade, sempre perseguindo crescimento e lucratividade.

Embora teorias, contemporâneas ou clássicas, possam servir de conhecimentos que farão parte dos raciocínios para criação dos modelos mentais, principalmente da parte de executivos seniores, responsáveis pelas estratégias e modelos de negócio, ao final, os caminhos a serem seguidos para enfrentamento da economia digital serão únicos de cada organização. Há o que na teoria dos sistemas se denomina de determinismo estrutural, que, numa definição bem simples, indica que um sistema está subordinado às modificações que sua estrutura permita.

TRANSFORMAÇÃO DIGITAL E REVOLUÇÃO DIGITAL 

A economia digital é o conjunto de atividades econômicas que usam tecnologias de computação digital, como a internet, para criar, distribuir, vender ou consumir produtos ou serviços. Também é conhecida como economia da Internet, nova economia ou economia da web.[2]

A economia digital está crescendo rapidamente, impulsionada pelo desenvolvimento de novas tecnologias, como a inteligência artificial, a internet das coisas (IoT) e a realidade virtual. Essas tecnologias estão permitindo a criação de novos produtos e serviços, a automatização de muitas tarefas antes intocadas pelas técnicas tradicionais e o nascimento de novos modelos de negócio.

Essa economia, em construção, tem um impacto significativo na economia global. Atualmente “La geografía de la economia digital está muy concentrada em dos países, Estados Unidos y China”,[3] mas é inevitável que todos os países do mundo sejam afetados. Os novos empregos impulsionam o crescimento econômico e transformam a maneira como se vive e se trabalha.

A Transformação digital se refere a tudo que uma empresa estabelecida precisa realizar para cumprir com os requisitos recentes da economia digital, em termos de processos, atividades e modelos. Essa transformação se dá de forma progressiva, até que a empresa se torne uma organização totalmente digital, em rede.[4]

A economia digital está promovendo uma revolução digital, que exige das empresas a revisão de suas estratégias e modelos de negócio. As mudanças estruturais necessárias à nova realidade, requer muita criatividade e empenho dos executivos, investimentos das empresas e assunção de novos riscos.

Compreender as áreas de risco é fundamental para as organizações que migram para a economia digital.[5]

A revolução digital, assemelha-se à revolução científica, no sentido atribuído por Kuhn. É um episódio não cumulativo em que há a substituição de um paradigma por outro.[6] A utilização do termo revolução dá-se, pois, as empresas e seus modelos de negócio, os paradigmas existentes, já não são suficientes para atender a uma nova realidade que se estabelece.

ESTRATÉGIA EMPRESARIAL E MODELOS DE NEGÓCIO 

Estratégia empresarial e modelo de negócio são dois conceitos fundamentais para o sucesso de qualquer empresa.

Estratégia empresarial é o conjunto de planos e ações que orientam e direcionam as empresas para alcançar os objetivos estabelecidos. É um processo de longo prazo que envolve a análise do ambiente interno e externo da empresa, a definição de objetivos e metas, e a elaboração de um plano de ação para alcançá-los.[7]

Modelo de negócio é uma descrição da forma como uma empresa gera valor, cria vantagens competitivas e gera lucros. É uma representação visual do negócio que ajuda a entender como ele funciona e como ele se diferencia dos concorrentes.[8]

A principal diferença entre estratégia empresarial e modelo de negócio dá-se em relação a transversalidade e a longitudinalidade. A estratégia empresarial é longitudinal. O foco é mais amplo e voltado para o posicionamento da empresa no mercado e a definição de seus objetivos e metas a longo prazo. O modelo de negócio, por outro lado, é transversal, pois tem um foco mais específico, voltado para a descrição de como a empresa cria valor e gera lucros no momento atual.

INOVAÇÕES SUSTENTADORAS E DISRUPTIVAS

Clayton M. Christensen (2003), faz uma distinção entre dois tipos de inovação: as sustentadoras e as disruptivas.

A economia digital classifica-se como uma inovação disruptiva, pois não se baseia em formas tradicionais de como criar, distribuir, vender ou consumir produtos ou serviços.

A velha economia permitia que as empresas vivessem de inovações sustentadoras, aquelas que sempre tinham como base uma forma estabelecida de criar, distribuir, vender ou consumir produtos. As inovações sustentadoras se dividem em incrementais e desbravadoras. Novidades sempre pressupõe uma base sobre a qual possam se efetivar, constituindo-se em quaisquer tipos de melhorias, sem que haja uma mudança radical nos produtos e serviços. As organizações envolvidas num paradigma estabelecido, no dia a dia das inovações sustentadoras, não vislumbram um fim para esses modelos e estruturam-se para atender uma fatia cada vez maior desse mercado.

As inovações disruptivas rompem com ciclos virtuosos de velhos paradigmas, criando formas, estabelecendo novos paradigmas. As estruturas das organizações, voltadas para o paradigma velho, já não suportam as novidades do novo paradigma que se estabelece. Esse novo paradigma irá funcionar com inovações sustentadoras até que haja uma nova disrupção.

TECNOLOGIAS BRANDAS E DURAS 

As tecnologias se caracterizam pelo conjunto de teorias e técnicas que possibilitam um aproveitamento prático dos conhecimentos científicos, bem como pelo conjunto dos instrumentos e procedimentos industriais de um determinado setor ou produto.[9]

As tecnologias brandas são aquelas que se referem a processos, métodos e ferramentas intangíveis. Elas se baseiam em conhecimento, habilidades e comportamentos. Todas as organizações se utilizam dessas tecnologias. A partir delas é que as empresas podem melhorar a eficiência e eficácia do negócio, imaginar novos produtos e processos.

Em uma empresa de desenvolvimento de software, por exemplo, incluem-se entre as tecnologias brandas os conhecimentos de seus analistas e programadores, processos de desenvolvimento dos produtos, gestão de projetos, gestão de seus riscos tradicionais e específicos, gestão da qualidade, gestão de pessoas e marketing. Embora se possa descrever cada um desses domínios, não há tangibilidade, não se pode transportar ou tocar esse tipo de tecnologia.

As tecnologias duras, por sua vez, são aquelas que se referem a produtos e equipamentos tangíveis.[10] Em uma empresa de desenvolvimento de software, por exemplo, todos os computadores utilizados na tarefa de construção de softwares enquadram-se nessa categoria. As tecnologias duras estão fortemente ancoradas em engenharia e ciência.

Há uma codependência entre essas tecnologias, brandas e duras.

TEORIAS VERSUS MODELOS MENTAIS 

O termo Modelo Mental foi proposto pelo psicólogo Philip Johnson-Laird.[11]

Segundo sua teoria, raciocinar envolve a construção de modelos mentais, cada um representando uma possibilidade e captura de diferentes maneiras de entender uma situação. Esses modelos nos mostram as possibilidades que podem ou não ocorrer, expectativas e contingência.

Estabelece-se uma diferença entre modelo mental e teoria. O modelo mental é uma representação interna de um fenômeno, enquanto a teoria é uma explicação sistemática do fenômeno. Nas organizações empresariais, os executivos criam modelos mentais para conduzir seus negócios, que podem ou não ter como base teorias estabelecidas. Os executivos não pensam em conceber teorias que se generalizem, ao contrário, devem manter seus modelos mentais específicos restritos ao ambiente interno das organizações, sempre que possível.

Modelos mentais são representações que as pessoas constroem para entender o mundo ao seu redor. Eles são formados a partir de experiências, crenças e valores. Os modelos mentais podem ser precisos ou imprecisos, úteis ou prejudiciais e não pretendem estabelecer uma verdade universal.

Teorias, por sua vez, não são simples construções de modelos mentais, elas compõem-se de conceitos e proposições que explicam um fenômeno e são aceitas por uma comunidade. Elas são baseadas em evidências e são testadas e refinadas ao longo do tempo. As teorias podem ser simples ou complexas e podem ser utilizadas para prever e controlar o mundo ao nosso redor.

Uma das grandes dificuldades dos executivos, quando estão diante de situações que exigem decisões rápidas, é que não conseguem falsear seus modelos mentais, como se poderia fazer com uma teoria, à maneira popperiana.

Para Popper, as teorias altamente falseáveis devem ter preferência sobre aquelas menos falseáveis e faz parte da ciência fazer proposição de hipóteses altamente falseáveis.[12]

Na falta de certezas e de possibilidades de testes de suas proposições, executivos aplicam seus modelos mentais, em suas organizações e assumem os riscos inerentes. Esses modelos mentais envolvem suas descrições do mundo (do entorno de suas empresas) e de como veem suas próprias organizações neste contexto. Não existem quaisquer pretensões de generalidade, no sentido de aplicação a quaisquer organizações, a respeito desses modelos mentais, que ao fim definirão as estratégias e os modelos de negócio, a não ser o desejo de fazer funcionar para suas organizações específicas, dadas as condições internas (sistema) e externas (entorno) em determinado momento.

Assim, o grande desafio pelo qual passam os executivos das organizações, é a criação de modelos mentais que sustentem modelos de negócio vencedores, promotores de crescimento e lucratividade, dentro da estratégia global da organização.

Como podem ser alteradas as estruturas de uma organização para funcionarem a contento em um novo contexto? Existem planejamentos bem elaborados, imutáveis, que podem estabelecer as novas estruturas futuras de uma empresa?

O DESAFIO DOS EXECUTIVOS FRENTE À ECONOMIA DIGITAL

A economia analógica é baseada, principalmente, em tecnologias duras, como máquinas, equipamentos e infraestrutura, a informação é transmitida de forma lenta e limitada, há uma dificuldade grande de escalabilidade e os produtos tendem ser massificados, sem personalização.

Em contrapartida, a economia digital é baseada, principalmente, em tecnologias brandas, em que são importantes os conhecimentos, a cultura; a informação é transmitida de forma rápida, grandes facilidades de escalabilidade e a tendência é pela personalização e segmentação.

A economia digital muda a maneira como muitas empresas criam, vendem ou consomem produtos e serviços, pois o esquema movimento/estabilidade agora pode ser percebido mais claramente. A estabilidade pode ser a curto prazo e a longo prazo as situações tendem a ser instáveis.

 Empresas que nascem nesse novo ambiente digital têm suas estratégias e modelos de negócio estruturados à nova realidade, naturalmente. Porém, empresas estabelecidas têm suas estratégias e modelos de negócio voltados para uma realidade diferente, que se esvai. À medida que a economia tradicional, analógica, dá lugar à economia digital, as empresas estabelecidas precisam alterar suas estruturas, para dar conta dessa nova realidade.

Lojas de roupas precisam criar lojas virtuais, os serviços bancários precisam ser prioritariamente on-line, empresas podem monitorar seus produtos em clientes por meio da internet, utilizando a internet das coisas (IoT).

ESTRATÉGIAS E MODELOS DE NEGÓCIO - QUAL O SEGREDO DAS EMPRESAS DE SUCESSO?

Na falta de teorias adequadas e testadas e talvez com base em exemplos de outras companhias, os executivos criam modelos mentais para análise de suas estratégias e modelos de negócio. Que mudanças são necessárias para atender a uma nova onda mercadológica?

Cabe aos executivos de cada empresa, decidirem sobre o futuro de suas organizações, tanto em termos de estratégia, quanto em termos de modelo de negócio; executivos não podem importar decisões prontas de outras organizações, pois os elementos que formam os sistemas organizacionais, as empresas, são decisões;[13] são eventos únicos que ocorrem no interior delas e adaptados às suas circunstâncias. De acordo com a Teoria dos Sistemas, “[…] aquilo que atua respectivamente como elemento não pode ser determinado independentemente de sistema” e complexidade organizada só pode se realizar mediante formação sistêmica, “pois complexidade organizada não significa outra coisa senão complexidade com relações, seletivas entre os elementos”.[14]

Parafraseando Luhmann,[15] a urgência imposta por um entorno que se altera rapidamente, não permite que as empresas esperem muito tempo para iniciar suas transformações. Há uma pressão seletiva, devem escolher e pressão seletiva significa contingência, que indica que sempre pode ser de outra forma, portanto, contingência significa risco. Assim, as empresas assumem todos os riscos inerentes a um futuro incerto, estabelecendo seus novos modelos de negócio e suas estratégias, com base nos modelos mentais de seus executivos. Mas é sobre uma base de decisões que um sistema organizacional se cria e se mantém.

Contingência significa também que nem sempre os executivos irão escolher a formação mais favorável. Assim é que, a estrutura de uma empresa não encontra igualdade estrutural em outros sistemas do entorno. As decisões não podem ser importadas, devem ser tomadas em cada organização, para criação de seus modelos mentais e depois para execução deles, com todas as alterações necessárias ao longo do caminho, também baseadas em decisões. A pressão seletiva cria a possibilidade de muitas organizações diferenciadas.

Tecnologias brandas e duras fazem parte da estruturação de quaisquer empresas nessa era contemporânea. Tão difícil, quanto alterar suas estruturas físicas, fórmulas, engenharias estabelecidas (tecnologias duras), é alterar as suas culturas, adquirir novos conhecimentos, modificar processos, métodos e modelos de gestão (tecnologias brandas).[16] Quando uma empresa precisa tomar decisões para alterar ou criar novos produtos, melhorar a eficiência e produtividade, melhorar a comunicação com seus colaboradores e clientes, criar técnicas para acessar novos mercados, introduzir agentes automatizados e colocá-los nas redes com agentes humanos, está-se falando de tecnologias brandas.

Os novos Modelos de negócio e as estratégias, se estabelecem a partir dos modelos mentais criados pelos executivos de cada organização. Entram em foco, principalmente, as tecnologias brandas. A atualização desses modelos de negócio e das estratégias para médio e longo prazos são decisões difíceis e complexas que envolvem riscos e apostas no futuro.

Mas, respondendo à pergunta no título deste artigo e baseado num clássico estudo de Lawrence e Lorsch, as empresas exitosas são aquelas que respondem adequadamente aos desafios do entorno respectivo, modificando suas estruturas globais, mecânicas ou orgânicas, para responder àquelas intempéries provocadas pelo ambiente.[17]

De acordo com a Teoria dos Sistemas Sociais, uma empresa, um sistema social, pode ser composta de subsistemas, como as diretorias comercial, de produção, administrativa, recursos humanos e outras. Esses subsistemas estão sujeitos às mesas regras de um sistema (ao final também são sistemas sociais organizacionais), assim cada um deles faz parte do entorno do outro, num ambiente interno da empresa, e como sistemas têm suas autonomias.

Conforme Lawrence e Lorsch, nas empresas de sucesso, esses subsistemas têm estruturas que correspondem adequadamente aos desafios dos seus ambientes respectivos. Em outras palavras, a diretoria de produção deve estar antenada com as dificuldades da diretoria comercial, bem como a diretoria de recursos humanos devem estar adaptada com a diretoria de produção e assim por diante. Nas empresas de sucesso há uma integração entre esses subsistemas, ainda que eles apresentem estruturas bem diferenciadas e autônomas.[18]

Lawrence e Lorsch enfatizam o enfoque de contingência, o que significa que não existe uma melhor forma de estruturar uma organização específica, mas que a estrutura de uma organização deve responder as demandas do ambiente. Assim também, dentro da organização, observando-se os seus vários subsistemas, não existe uma melhor forma de estruturar cada um deles; isso vai depender dos fatores estratégicos e considerando-se seu ambiente.[19]

Um sistema social organizacional (para este artigo uma empresa) que disponha de estruturas e processos próprios, pode coordenar todos os seus elementos que produz e reproduz (decisões) potencializando a seletividade. Assim o sistema pode determinar a maneira como se constrói (regulando sua própria autopoiese).[20]

Parafraseando Luhmann, cada empresa observa a revolução digital de uma forma e como ela está inserida nesse contexto (auto-observação). A empresa se vê como um sistema em um entorno complexo e isso nada mais é que introduzir a diferença sistema/entorno em suas análises. Assim, a auto-observação é um momento da operação da autopoiese, porque ao reproduzir seus elementos (decisões), a empresa tem de assegurar-se que essas decisões sejam dela e especificamente para ela.[21] Há de se ressaltar que as observações criam uma realidade fictícia, pois ninguém é capaz apreender a complexidade do entorno, tampouco adivinhar o futuro, e existem muitas casualidades, embora façamos de conta que não existam casualidades.

Para a Teoria dos Sistemas Sociais de Luhmann, a categoria entendida como autopoiese determina que o próprio sistema crie seus elementos e suas estruturas (no caso das empresas, seus elementos são decisões e elas se estruturam a partir destas decisões), mas não determina que elementos e que estruturas devem ser criadas; a escolha dos caminhos se dá no sistema, no momento da operação. Por esta razão, sistemas autopoiéticos podem responder sempre da mesma maneira, mas também podem ser surpreendentes e criativos. Em outras palavras, o fato de um sistema ser autopoiético não determina que estruturas deva criar, a forma que deverá adquirir e a ordem de seus elementos. A autopoiese deixa aberta a possibilidade de criação de muitos tipos de estruturas.[22] Para o sistema desaparece a distinção entre o mundo como ele é o mundo conforme observado. O sistema social organizacional (empresa) tem uma estrutura que dá conta do mundo conforme observado por ele.

Assim, as empresas são sistemas autopoiéticos que procuram se diferenciar, aparecer como diferentes para seus clientes, criando suas próprias estruturas, a partir de processos internos (operação). Em momentos de disrupção, principalmente, as empresas continuam seus processos de diferenciação a partir de seus modelos mentais únicos, com resultados de sucesso ou insucesso. Não há teorias que garantam o sucesso de todas as organizações quando da entrada delas em um novo contexto. A complexidade das relações estruturais entre o sistema e o entorno não podem ser sistematizadas.

UM GLADIADOR NUM COLISEU 

E como conclusão, para reafirmar a não existência de teorias prontas e confiáveis que possam ser utilizadas pelas empresas, como um modelo padrão, para enfrentamento da revolução digital, trago algumas afirmações de Kai-Fu Lee.

Conforme Kai-Fu Lee, os empreendedores da internet chinesa estão no ambiente mais cruel do planeta. Eles vivem em um mundo no qual a velocidade é essencial e os concorrentes não hesitam em fazer qualquer coisa para conquistar um novo mercado. Lee compara o dia de uma start-up chinesa com o dia de um gladiador no Coliseu. “A única maneira de sobreviver a essa batalha é melhorar constantemente o produto, mas também inovar em seu modelo de negócios e construir um 'fosso' em torno de sua empresa.” Lee, complementa afirmando que

Os mercados desordenados e os truques sujos da era “imitadora” da China produziram algumas empresas questionáveis, mas também incubaram uma geração composta pelos empreendedores mais espertos, hábeis e batalhadores do mundo. Essa geração será o ingrediente secreto que ajudará a China a se tornar o primeiro país a lucrar com a era da implementação da IA.[23]

Essas afirmações de Lee deixam claro que no ambiente das empresas estão, também, os concorrentes e se todos tiverem modelos de negócios iguais haverá empate, mas o que ocorre é o contrário, a concorrência leva as empresas a criarem suas próprias estratégias e seus próprios modelos de negócio, a partir dos modelos mentais de seus executivos e gestores graduados e não com base em teorias estabelecidas que determinem critérios confiáveis para que todas as organizações enfrentem disrupções, como a provocada pela nova economia digital.

REFERÊNCIAS

[1] Christensen, Clayton M. O crescimento pela inovação: como crescer de forma sustentada e reinventar o sucesso; tradução: Afonso Celso da Cunha Serra. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 31-32.

[2] Rete, Oscar M. Transformción digital I. Aula ministrada pelo Dr. Oscar M. Rete, no Curso de Doutorado na Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales (UCES), Buenos Aires, jul. 2023. Slides.

[3] Ibidem.

[4] Rete, Oscar Miguel. La implementación de tecnología blanda para el mejoramiento competitivo: estudio de caso - empresas PyMEs del sector industrial metalmecánico en la Provincia de Córdoba, Argentina. 2020. 254 f. Tese (Doutorado) - Universidad en Ciencias Empresariales y Sociales, Buenos Aires, 2020.

[5] Rete, Oscar M. Transformación digital II. Aula ministrada pelo Dr. Oscar M. Rete, no Curso de doutorado na Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales (UCES), Buenos Aires, jul. 2023. Slides.

[6] Kuhn, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas; tradução: Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 12. ed. São Paulo: Perspectiva, 2013, p. 287.

[7] Rete, Oscar M. Estrategia empresarial y modelos de negocios. Aula ministrada pelo Dr. Oscar M. Rete, no Curso de Doutorado na Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales (UCES), Buenos Aires, jul. 2023. Slides.

[8] Ibidem.

[9] Rete, Oscar Miguel. La implementación de tecnología blanda para el mejoramiento competitivo: estudio de caso - empresas PyMEs del sector industrial metalmecánico en la Provincia de Córdoba.

[10] Ibidem.

[11] Caetano, Soraia. Teoria dos Modelos Mentais - Johnson-Laird. Disponível em: < psicologiaparasi.blogs.sapo.pt >. Acesso em: out. 2023.

[12] Chalmers, Alan F. O que é ciência, afinal?; tradução: Raul Fiker. 1 ed. São Paulo, Brasiliense, 1993, p. 70-72.

[13] Não se pode fazer um aprofundamento teórico com relação a esta afirmação. Os sistemas sociais organizacionais (empresas) são considerados também sistemas de comunicação. O que ocorre é que há um acoplamento estrutural entre o sistema de comunicação e o sistema de decisões. Sem comunicação é impossível ter um sistema de decisões. Sem comunicação não se poderia ter as empresas da forma como conhecemos.

Os biólogos Maturana e Varela criaram o termo acoplamento estrutural para designar as perturbações mútuas que existem entre o sistema e o entorno, tendo como resultado o desencadeamento de mudanças nos estados de suas estruturas. O termo não designa que um sistema atue diretamente na estrutura de outro, mas que “[…] meio e unidade atuarão como fontes de perturbações mútuas e desencadearão mutuamente mudanças de estado. Maturana, Humberto R.; Varela, Francisco J. A árvore do conhecimento; tradução: Humberto Mariotti e Lia Diskin; ilustração: Carolina Vial, Eduardo Osorio, Francisco Olivares e Marcelo Maturana Montañez. São Paulo: Palas Athena, 2001, p. 112.

Luhmann adotou esse termo durante seus estudos. Anteriormente, Luhmann utilizava o termo “interpenetração” (Criado por Parsons), que designa que um sistema coloca toda a sua complexidade à disposição de outro, para que o outro se construa. Luhmann, Niklas. Sistemas sociales: Lineamientos para una teoría general; tradução: Silvia Papper; Brunhilde Erker; coordenação: Javier Torres Nafarrete. Santafé de Bogotá: CEJA, 1998,205.

[14] Luhmann, Niklas. Sistemas sociais: esboço de uma teoria geral; tradução: Antonio C. Luz Costa, Roberto Dutra Torres Junior, Marco Antonio dos Santos Casanova. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.

[15] Ibidem.

[16] Rete, Oscar M. Transformaçión digital I.

[17] Mansilla, Darío Rodríguez. Gestión organizacional: elementos para su estudio. 5 ed. Chile: Pontificia Universidad Católica, 2011.

[18] Ibidem.

[19] Ibidem.

[20] Luhmann, Niklas. Sociedad y sistema: la ambición de la teoría; tradução: Santiago López Petit; Dorothee Schmitz. 1 ed. Barcelona: Espasa, 1990.

[21] Ibidem, p. 97.

[22] Luhmann, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas; tradução: Ana Cristina Arantes Nasser. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

[23] Lee, Kai-Fu. Inteligência artificial: como os robôs estão mudando o mundo, a forma como amamos, nos comunicamos e vivemos; tradução: Marcelo Babão. 1. ed. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019.







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Artigo pelo Eng. Éder Lungen, gerente de vendas da Bermo Válvulas e Equipamentos Industriais Ltda